segunda-feira, 30 de março de 2009

Madeira
Como tivesse vida
madeira corta asas
imagem sem imagem, madeira sem árvore
fecundidade sacrificada
viva linguagem convertida do verde herbario
infundem no vigor de vida física
subitamente estática
não ser árvore, mas ser palavra
madeira - ausentar-se de árvore
ausência sem lei - à deriva
madeira contenta-se em transportar
ópio da imagem
vaporosa miragem.

sexta-feira, 27 de março de 2009

Menina

Ouço o interior dos teus sonhos como a primavera que cruza o rio
cruza o sonho que tu sonhas
Eis-me aqui... cheia de cantigas de ninar
Pra lembrar que teu céu é imensamente azul
que todas luas te espiam, por trás das estrelas pra cuidar do teu mundo
e deixá-lo iluminado com todos os tons musicais
assim o vento corre levando a você todos verbos alegres
cada palavra é uma borboleta menina
de grave beleza. de curiosidade idade
que anjo menina, apenas espia a vida...

sábado, 14 de março de 2009

S U S P I R O S

A cozinha estava escaldante. Era um dia muito quente. Ela nunca havia sentido tanto calor.
Batia vigorosamente clara de ovos colocada no prato fundo. Estava preparando para seus dois netos, que viriam visitá-la logo mais tarde, gostosos e caprichados suspiros. Docinhos que eles muito apreciavam, e que entre suspiros de satisfação, diziam sempre que aqueles, feitos pela vó eram os melhores. Tinha por isso muita satisfação ao fazê-los
Ganhara de sua filha, há pouco tempo, uma batedeira até bem moderna, mas de uso um pouco complicado. Preferia então bater as claras com o garfo, o que era mais cansativo, porém achava que assim ficavam melhores, e também não fazia tanto barulho.
Quando percebeu que as claras estavam bem consistentes, preparou a forma e iniciou o trabalho de pingar os suspiros, conseguindo que ficassem em fileiras bem certinhas. Á medida que ia colocando os docinhos na forma dava um puxaozinho na colher, para que assim se formasse em cima de cada um deles uma ponta meio longa, que os deixavam mais bonitos e com melhor aparência.
Enquanto fazia esse trabalho, lembrava de seu pai, que há muitos anos atrás, lhe contara a historia da guerra na Rússia. Ali os soldados usavam capacetes redondos de metal, e que tinham em cima uma haste aguda apontada para o alto. Parecia até ser uma arma que eles usariam se necessário, para defender-se. Seus suspiros lembravam aqueles capacetes. Ela até havia visto fotos daqueles militares em jornais bem antigos, marchando em formação perfeita. Deu um suspiro profundo, sentindo saudades de seu pai e das interessantes histórias que ele contava.
Continuou pingando as clara em filas bem certinhas. Enquanto trabalhava sonhava, e via nos suspiros as fileiras daqueles velhos soldados marchando garbosamente.
Se, seus netos pudessem vê-los iriam vibrar.
Quando colocou o último docinho, estava muito cansada e sentiu uma leve tonteira. Deixou a forma em cima do fogão e acendeu o forno. Pareceu-lhe que a tontura ficava mais forte. Sentou-se no chão.
Nesse momento seus dois netinhos entraram correndo na cozinha, fazendo uma bruta algazarra e rindo alegremente. Vendo os docinhos na forma. Gritavam:
Oba vó! Que legal! Está fazendo suspiros para nós? Vai demorar?
Estavam loucos para devorá-los.
Ouviu, mas não pode responder. Entreabriu os olhos, mas não conseguiu vê-los.
Sorriu levemente. Os meninos ouviram então um som diferente que vinha de dentro do peito da avozinha. A respiração dela estava esquisita, bem forte.
De repente ela levantou com força o queixo, gemeu e exalou seu último suspiro.
Curitiba, novembro de 2008.
Suzi Mariano Gubert.

quinta-feira, 12 de março de 2009

Substância humana
objeto modelado de fome
bela desordem na caixa mágica
translúcida no ar lúcido
suave como uma bolha de ar
longínquo passado aflito
a química
o corpo
fragmentos da existência
dossiê de camadas do inconsciente
a tentação de narrar uma variedade de tons
orquestra silenciosa
a tentação de decidir
natureza impensada
galopando palavras
apodero-me
escolhê-las
lançá-las livremente no alvo
num rio rolando
fluxo
refluxo
fios
luzes
vida

sábado, 7 de março de 2009

DIA DA MULHER

SER MULHER é ter consciência exata do certo e do errado, firmeza em suas decisões, pensar antes de tomar atitudes, agir sem medos, ser centrada, coesa, verdadeira no que diz e faz, seguindo á risca seus bons princípios que não admitem enganos.
Deve estar sempre atenta, tanto em sua vida doméstica, como na profissional. Ter ótima condição física e psicológica, porque são duas jornadas diferentes que precisam ser bem conciliadas, para não perder o norte e nem a coragem, sentimentos estes inerentes ao sexo feminino. Nesse contexto estão as obrigações diárias, que parecem corriqueiras mas que na verdade são exaustivas e desgastantes.
Neste dia especial, escolhido pela sociedade para ser o “DIA da MULHER”, quase nada muda ou fica diferente.
Ser mulher, mesmo no dia a ela dedicado, a rotina continua. Tem que levar o filho ao colégio, adivinhar se o menino vai precisar ou não do agasalho, pois com esse tempo eternamente instável não sabe se vai chover ou fazer frio. Já a caminho tem que voltar, pois, o garoto esqueceu o caderno de matemática com a lição do dia.
Isso tudo, ela faz sozinha, porque o marido sempre tem mais pressa. Mesmo já tendo tomado o café que o esperava na xícara, ter sido avisado para ir a reunião de pais no colégio do filho, aonde ela irá esperá-lo, e lembrá-lo também de ir ao dentista, no horário marcado para hoje. Ele nem toma conhecimento desses detalhes, embora não precise passar cremes, acertar sobrancelhas, e nem abotoar o desagradável sutien. Ela tem absoluta certeza que se não der esses avisos, ele não vai lembrar de nada.
Enquanto isso precisa colocar as meia, dar uma lixadinha na unha que lascou, procurar a chave do carro, e pedir mais uma vez ao filho que se apresse, pois do contrário terá que pegar o menino pelo colarinho e sair correndo para tirar o carro, porque estão em cima da hora.
Ser mulher é dirigir, ao mesmo tempo em que fala no celular, dizendo à empregada o que deve ser feito para o almoço, pois esta, ainda não havia chegado, quando teve que sair.
Ser mulher é ainda demonstrar competência, responsabilidade e pontualidade em seu trabalho de executiva. Para isso terá de completar hoje, o relatório, que seu diretor pediu para ser entregue até amanhã sem falta.
Logo que sai com o carro, o celular bate. È o marido pedindo á ela que vá até a lavanderia pegar suas camisas, pois vai precisar para o jantar da empresa em que trabalha logo mais á noite. E ainda, recomendando para ela não se atrasar pois terão que antes passar no hotel, onde estão hospedados o diretor e a esposa e leva-los ao dito jantar. Ouve o recado do marido com as mãos no volante, morrendo de medo que a verdinha a veja cometendo essa infração, lhe dará multa, e a fará perder mais uns pontinhos na carteira.
Ser mulher é ainda ter que ir ao cabeleireiro, pois vai acompanhar o marido naquele encontro onde todos estarão com as esposas. Aí, ela deve estar de bom humor, alegre e com ótima aparência. Ter de manter conversação com aquelas mulheres que mal conhece, e com as quais não tem a mínima intimidade.
Enquanto isso lembra, que ainda não conseguiu terminar o relatório, para ser entregue ao seu diretor, amanhã sem falta. Vai ter que fazê-lo quando chegar da festa, pois não pode deixar para o dia seguinte. Se deixar vai ser uma barra. Mas, apesar de todo esse sufoco não vai abrir mão de nada. Irá ao jantar sim, e também fará seu relatório. Enquanto isso ELE já estará no terceiro sono.
Ser mulher é muitas vezes, fazer o que não gosta, ir onde não quer, ouvir o que não precisa, e fazer o possível para não ficar cansada.
Sabe, entretanto, que faz tudo isso imbuída da maior satisfação pessoal. Pois sente muito orgulho pela profissão que abraçou, sua casa é seu paraíso, seu filho é sua vida, e tem um grande, imenso amor por seu marido.
Bom mesmo seria nesse dia, que dizem ser o DIA da MULHER poder soltar o cabelo, por um vestido bem bonito e confortável, dar boas e gostosas risadas, beijar seu filho com todo amor e carinho, e o melhor de tudo isso é então sair, sem pressa, descontraída e feliz para ir dançar com o marido.

Curitiba, março de 2009.

Suzi Mariano Gubert.






sexta-feira, 6 de março de 2009

Dobras no Papel

Como a criança cria em tudo,
Criava tudo na imaginação,
Dobrava o papel, fazia um barco,
Com outro papel, eis um avião...

Não pensava em conhecer novos mares,
Nem queria alcançar novos céus,
Dobrava, dobrava, dobrava, dobrava...
Despretensiosos sonhos de papel.


De Clauber Ramos

A Vida se encaixa em caixas:


Caixinha de surpresa,

Caixa de Pandora,

Caixa - forte,

Caixa - preta,

Caixão.

quarta-feira, 4 de março de 2009

Não conhecer
No canto escuro do quarto palavras úmidas estão penduradas – dói olhar para o papel em branco – porque desconheço o que ali está escrito – monótonas palavras, não conheço conceitos de mundo... no cenário espiam-se indecifráveis imagens... porque meu mundo é do tamanho do que vejo... queria esmagar e calar as palavras que gritam estilhaçando meu silêncio – é assim que muitas vezes tenho matado o que não compreendo... assim como a chuva intimida o sol, a cegueira do não conhecer transforma a vida num sono – aborrecidas palavras mudas - coladas no frio da alma – fico ali parado – assistindo ao desconhecido – extrema imaginação justificada – só me encontro no espelho, onde consigo ler minha própria imagem...
Nazareth Queiroz
Fev/ 2008
Arcanjos
Por que pedir a todos os arcanjos...
Um coração gira atrás do sol
Suas palavras percorrem águas profundas
Juntas não se fundem
Estão amarradas por palavras isoladas
Ouça! Ninguém chega até aqui
Há uma vereda secreta, nesta vasta floresta
Você pode subir num balão e olhar de longe
Que frases estão sendo formadas
Todos os pronomes do tempo
Vem vindo como um sonho
Por isso não rasteje feito asas de borboleta
a vida é feito pele de cobra flutuante
uma filosofia de coisas
que tamborilam feito pingos de chuva na cabeça...
Março/ 2009
Nazareth Queiroz
Calar


As tarefas de meu Pai
Estão sendo relegadas
Por pura insubordinação
Por orgulho, por pirraça.
Por grande incompreensão
Teu passado é teu presente,
Como agora é teu futuro
Se plantares colherá,
Com a mesma proporção.
Recompõe teu equilíbrio
Adoça a boca com o amor,
Em vez de fel do egoísmo,
Engolindo a própria dor.
Calar, calar, esta é a chave
do verdadeiro saber,
Porque falar sem iluminar
É como nada dizer.


Março, 2009
Zélia Crisóstomo